31 maio 2009

RESTAURANTE SINAL VERMELHO

Respeitar o sinal

Boa cozinha portuguesa num sinal onde é obrigatório parar e abancar.

José Quitério

Paralela à Rua da Misericórdia (entre esta e a Rua do Norte), ligando a Travessa da Queimada com a Praça Luís de Camões, a Rua das Gáveas foi das primeiras a ser rasgada (século XVI) no que viria a ser o Bairro Alto, em Lisboa. É possível que deva o nome a esse termo naval que designa a plataforma do mastro donde o gajeiro espiava o mar, pois os primeiros residentes foram marítimos da Ribeira das Naus. Nem a antiguidade nem a origem a salvam de um certo ar bisonho, longe do pitoresco das vizinhas. Tem direito, todavia a ser evocada por um dos autores anónimos da colectânea setecentista "Anatómico Jocoso" (1752): "Ah Bairro! Quem te conhecer que te compre; mas tu já estás vendido, porque a todos trazes vendados; (...) tens a Rua da Trombeta, por onde a fama as tuas proezas publica; (...) tens a do Norte, onde se vê se ele corre direito; tens a das Gáveas, onde o gajeiro do apetite ferra o velame do desejo", etc. Com que então, apetite e desejo?!

Não venho trombetear novidade nem desvendar o norte, pois o que encontramos no nº 89 (a fazer esquina com a Travessa do Poço da Cidade, nome este o da tasca que lá houve anteriormente), o Restaurante Sinal Vermelho, foi fundado em Setembro de 1986. Pouco a pouco, os seus obreiros, Victor Castro e César Gil (haviam sido empregados n'A Severa), conseguiram ir aumentando o espaço e fazendo as obras de remodelação até à configuração actual (quase inalterada desde 1993): duas salas praticamente lado a lado, onde os 65 mastigantes gozam de instalação aprazível e amesendação correcta.

A lista fixa regista 13 Entradas, 2 pratos de Ovos, 4 Vegetarianos, 9 Peixes, 2 Bacalhaus, 5 Carnes e 4 Bifes (de vitela barrosã). Variáveis são as 12 Recomendações do Dia, divididas entre peixe e carne, às vezes a irem socorrer-se da parte firme. No conjunto, uma carta de comidas variada e muito apelativa para quem procura cozinha portuguesa tradicional e regional, sem rodriguinhos.
A provar é que a gente se entende. O "dueto de chouriço e alheira de Valpaços com azeitonas" (€6,90), ainda com finas rodelinhas de linguiça, demonstrou, e basta, a elevada categoria das matérias-primas. Bem os "peixinhos da horta" (€5,90), em canudinhos de polme farto mas de feijão verde em presença forte. Sobre o comprido e altura dum dedo magro, equilibradas no bacalhau e na farinha, fritura certa, fofas, deliciaram as três unidades do "prato de pataniscas de bacalhau" (€5,90). Adoptados para a função entradeiras, os "pastéis de massa tenra" (com acompanhamento de arroz de feijão e couve lombarda teriam custado 9,90) mostraram-se de cabal massa exterior e recheio competente, granulado e temperado a contento.
Passando das entradas para os pratos principais, no "magusto de bacalhau assado com migas de broa e couve portuguesa" (€11,90), muito boas estas, a posta de gadídeo a necessitar de menos demolha e mais grelha. Com a reserva de o arroz estar pouco atomatado e algo aguado, excelentes os "filetes de peixe-galo com arroz de tomate" (€12,90), mais uma especiosa salada de canónigos, beterraba, tomate e rebentos de soja. Com o senão da carne a tender para o rijo, comeu-se com suficiente agrado o "ensopado de borrego com pão frito" (€9,90). Igualmente com cenoura e carnes de porco, nem o facto de o chouriço ser de qualidade muito inferior ao da entrada afectou o saboroso teor geral da "feijoada com entrecosto de vitela, lombardo e enchidos regionais à moda de Ponte de Lima" (€9,90). Forte e gostoso, com batatas chips e lombardo cozido por companhia, o "coelho em vinha-d'alhos frito com amêijoas e coentros" (€10,90).
Há queijos, não testados. Os doces andam pela dúzia e os experimentados não desiludiram. Carta de vinhos pujante, dividida por regiões, tudo datado, alguns com descrição e notas de prova: 109 tintos, 34 brancos, 8 verdes brancos, 1 verde tinto, 7 champanhes e 13 espumantes. Serviço atento e amável.
Sem que se possa deixar de mencionar Amélia Rodrigues, cozinheira da casa há 22 anos, neste Sinal Vermelho é gratificante parar, entrar e abancar.

Sinal Vermelho
Rua das Gáveas, Nº 89 Lisboa
Tel. 213 461 252
(fecha Sábados e segundas ao almoço, Domingos e feridos todo o dia)
9:00 Sexta-feira, 20 de Mar de 2009

http://aeiou.expresso.pt/respeitar-o-sinal=f503772