A galeria de arte que agita a noite do Bairro Alto
por LUÍS FILIPE RODRIGUES
A Zé dos Bois nasceu em 1994, e está na Rua da Barroca desde 1997. O bar do primeiro piso continua a ser o palco de uma série de concertos. Pelos outros espaços há exposições, 'performances' e até uma livraria.
A história repete-se todos os fins de semana. Enquanto descem a Rua da Atalaia, em direcção ao carro, um bar ou um restaurante, dezenas de pessoas, de copo na mão, param a meio do caminho. Têm que olhar para o lado de lá de um vidro, onde bandas rock, com guitarras e tambores, ou músicos mais periféricos, com teclados e outros instrumentos, tocam para um público calmo. Estes músicos e os seus fãs também olham lá para fora, para a rua. Esta é a galeria Zé dos Bois.
O casarão da Rua da Barroca, no coração do Bairro Alto, é hoje um dos espaços icónicos da noite de Lisboa. Contudo, a Zé dos Bois nem sempre foi ali. No ano da fundação, em 1994, Lisboa era a Capital Europeia da Cultura, e a galeria, baptizada em homenagem ao artista alemão Joseph Beuys ficava na Rua da Vinha. Nos primeiros anos ocupou uma série de outros espaços, até se estabilizar na actual morada há mais de dez anos, em 1997.
Mas esta galeria foi sempre muito mais que um espaço físico. A ideia sempre foi a de dar uma maior visibilidade a artistas que não se articulassem no actual circuito comercial, em campos como as artes plásticas, a dança, a performance ou a música. E é isso que tem vindo a fazer. Ao nível da música, a ZdB tem sido a grande responsável pela abertura do mercado nacional a uma série de projectos, nas vanguardas das elec- trónicas, do rock, da folk ou de outras novas expressões da música urbana. Sobretudo nos fins de semana, quando o bar abre as portas e os concertos começam.
No "aquário" bebe-se um copo enquanto grupos como os Ruby Suns ou No Age actuam ao vivo e, lá fora, os transeuntes observam a sala, curiosos. Ao mesmo tempo, é normal encontrar grupos de amigos à conversa no bar, indiferentes aos músicos que apresentam os seus projectos. Limitam-se a conversar e fumar um cigarro enquanto uma qualquer banda toca.
E se hoje os funcionários são remunerados pelo seu trabalho, nem sempre foi assim. "Quando o projecto nasceu, em 1994, as pessoas não recebiam nada", lembra o programador Sérgio Hydalgo. De resto, o espaço tem crescido nos últimos anos, trazendo a Portugal grupos cada vez maiores, e organizando espectáculos fora do Bairro Alto, em sítios como um armazém no Ginjal, a LX Factory ou o parque de estacionamento subterrâneo do largo de Camões.
Não obstante, a ZdB não se limita a dar música aos lisboetas. No passado fim-de-semana, por exemplo, abriu as portas a quem quisesse ver o resultado das recentes residências de artes visuais. Centenas de pessoas admiraram as instalações enquanto bebiam um copo, nos pisos mais acima. Na próxima sexta-feira inaugura mais uma exposição: À Esquerda da Esquerda. A ZdB alberga ainda uma livraria Ler Devagar, que fica no espaço onde em tempos se realizaram centenas de concertos.