De lágrimas nos olhos, a fadista Argentina Santos solta um desabafo: "Foi como se tivesse morrido uma pessoa." Apesar de ser gerente da casa Parreirinha de Alfama há 60 anos, viu com tristeza o fim da concorrente Adega Machado, símbolo das casas de fado lisboetas, que fechou portas há uma semana.
Entre Alfama e o Bairro Alto, a reacção é a mesma: espanto e já saudade por um espaço aberto há 72 anos e que deixou agora 28 pessoas no desemprego.
Na mais antiga de todas, a quase já centenária Adega Mesquita, a crise também se sente e só a paixão do gerente Paulo Gomes, 70 anos, mantém a casa de portas abertas e aspecto renovado: "Há subsídios para tudo, mas para a canção nacional não há. A Adega Machado era badalada, mas aqui já vi várias outras fecharem", contou ao CM.
Com casa cheia, o gerente de O Faia, António Ramos, vê também com pena o encerramento da casa de fado fundada em 1937 e lembra que a fórmula do sucesso passa por perceber as mudanças: "Temos de nos ir actualizando. As casas de fado não podem envelhecer", diz.
Com uma clientela essencialmente estrangeira, a maioria dos espaços do centro de Lisboa sentiu a crise global. No caso do Clube de Fado, em Alfama, apesar de alguns clientes reduzirem no consumo, o sentimento é de optimismo: "A depressão existe, mas tenho uma casa feliz. Num país onde toda a gente gosta de se vitimizar, vou bem de saúde", diz o guitarrista e gerente Manuel Pacheco.
"ERA O NOSSO GANHA-PÃO"
Dídia Pereira, 44 anos, estava de férias no Algarve com o marido, Diamantino, quando soube do encerramento do espaço onde ela servia à mesa e ele tratava da contabilidade: "Sempre sentimos esta casa como nossa. Era o nosso ganha-pão", conta ao CM. O fecho da Adega Machado por dívidas à Segurança Social, ao Fisco e a fornecedores, apanhou de surpresa os 28 trabalhadores, agora no desemprego. "Há casas aí a funcionar com muito menos condições do que esta e estão de portas abertas", conta a fadista Maria Portugal. Fundada em 1937 na rua do Norte, pelos artistas Armando e Maria de Lourdes Machado, era um símbolo das casas de fado do Bairro Alto.
REACÇÕES
"Estou desempregada e quando soube julguei que não estava a ouvir bem. Onde vou arranjar emprego agora? Quem tem gente em casas de fado não os vai despedir.": ANA CARVALHO Fadista
"Fiquei espantada com o fim da Adega Machado. Nunca pensei que uma sala com aquela categoria fechasse. Era um símbolo e passou por lá muita gente importante.": ANITA GUERREIRO Fadista
Rui Pedro Vieira
Fonte: Correio da Manhã